Sem controladoria, PMEs crescem no escuro, e os números já mostram o impacto
Grande parte das pequenas e médias empresas (PMEs), principalmente familiares, vivenciam um problema recorrente:
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Crescer rápido demais, sem consolidar sua estrutura financeira. É como acelerar um carro sem olhar o painel, você até ganha velocidade, mas ignora sinais críticos.
Com ampla experiência no ambiente corporativo, atuando como Advisor à frente da MORCONE, Carlos Moreira tem auxiliado e orientado empresas, especialmente empresas familiares brasileiras a se estruturarem para chegar aos 100 anos.
Neste artigo, o especialista traz reflexões sobre algo em que acredita profundamente: crescer sem uma controladoria eficaz é avançar sem visibilidade.
Ele discute sobre o papel estratégico da controladoria nas PMEs, como pode funcionar como uma “segunda opinião” e de que forma o conselho consultivo e a governança entram nessa equação.
O contexto urgente: dados que não podemos ignorar
Para ilustrar a gravidade da situação, basta olhar para alguns dados recentes:
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Segundo a CNN Brasil, o número de empresas inadimplentes no Brasil chegou a 7,2 milhões em 2025, sendo que 6,8 milhões delas são Micro e Pequenas Empresas (MPEs), com dívidas acumuladas de mais de R$ 141,6 bilhões;
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No mesmo levantamento, fica evidente que os pedidos de recuperação judicial cresceram 61,8% em 2024, totalizando 2.273 solicitações;
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Além disso, análise do Serasa Experian relatou que as MPEs lideraram esse movimento, com um salto de 78,4% nos pedidos de recuperação judicial;
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Paralelamente, uma pesquisa recente do Instituto Locomotiva mostra que 90% das PMEs enfrentam crises por má gestão financeira, especialmente pela falta de estrutura e planejamento.
Esses números refletem a fragilidade das PMEs quando crescem sem controle. E aqui entra o papel crítico da controladoria.
Controladoria como “segunda opinião”: por que sua PME precisa dela?
Quando falo em controladoria, não estou me referindo apenas à contabilidade tradicional. A controladoria nas PMEs, bem estruturada, oferece:
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Visão estratégica: vai além de registrar receitas e despesas, promovendo projeções financeiras, análises de investimentos e simulações de cenários;
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Radar de riscos: identifica desvios de rota antes que eles se tornem crises, por exemplo, margem de lucro comprimida, endividamento mal estruturado, ou desalinhamento entre contas a pagar e receber;
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Transparência real: com controles e relatórios robustos, a empresa enxerga o que está escondido na DRE (Demonstração do Resultado do Exercício), não apenas o que parece bom no papel.
Muitas PMEs familiares que acompanho acabam tratando o DRE como uma formalidade. Mas se não houver uma análise técnica, uma “segunda opinião” experiente, você corre o risco de confundir crescimento de faturamento com crescimento sustentável.
Conselho consultivo e governança: profissionalizando o processo
Aqui entra outra peça fundamental: o conselho consultivo. Em PMEs, sobretudo as familiares, a figura do conselheiro experiente tem se mostrado transformadora. Por quê?
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Olhar externo estratégico: conselheiros com background em finanças e gestão ajudam a interpretar os números além do óbvio, identificando padrões preocupantes e sugerindo ações corretivas;
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Pressão saudável por disciplina: com conselheiros atentos, a empresa tende a adotar práticas mais maduras de governança, como reuniões periódicas, KPIs financeiros, revisões de orçamento e análises cruzadas entre DRE, fluxo de caixa e balanço patrimonial;
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Planejamento de longo prazo: além da gestão operacional, o conselho consultivo contribui para decisões mais estruturadas sobre expansão, captação, alocação de recursos e financiamento.
Minha experiência como consultor e conselheiro mostra que conselhos bem estruturados ajudam a transformar empresas com potencial em organizações preparadas para o futuro, em vez de negócios vulneráveis em tempos de adversidade.
O que a DRE pode estar escondendo?
A DRE, quando lida apenas superficialmente, pode mascarar muitos riscos. Sem uma controladoria ativa e um conselho consultivo questionando e interpretando:
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Receitas pontuais (como pedidos grandes ou eventos excepcionais) podem dar a falsa impressão de sucesso, escondendo que a margem real é baixa;
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Custos fixos escondidos ou sobressalentes (salários, manutenção, provisões) podem corroer o lucro de forma gradual e silenciosa;
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Endividamento mal estruturado (juros altos, prazos curtos) pode comprometer o fluxo de caixa futuro, mesmo que hoje a empresa pareça saudável;
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Problemas de liquidez podem não aparecer claramente, se a empresa não cruzar os dados da DRE com projeções, orçamento e fluxo de caixa realista.
Sem esse “olhar técnico”, crescer pode ser apenas uma ilusão frágil.
Implantando uma controladoria estratégica e um conselho consultivo
Se você lidera ou participa da gestão de uma PME, aqui estão alguns passos práticos para fortalecer sua estrutura financeira, profissionalizar processos e construir governança:
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Diagnóstico inicial
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Identifique os gargalos financeiros mais críticos: previsibilidade de receitas, liquidez, endividamento;
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Invista em uma consultoria ou em um conselheiro externo experiente para um primeiro diagnóstico, mesmo sem ainda ter um conselho formal.
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Implementação da controladoria
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Estruture relatórios claros: DRE, fluxo de caixa, balanço, projeções;
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Defina KPIs financeiros: margem, liquidez, endividamento, ponto de equilíbrio, entre outros;
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Estabeleça reuniões periódicas para analisar esses relatórios e discutir hipóteses de cenários futuros.
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Formação do conselho consultivo
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Selecione conselheiros com experiência em finanças, governança e gestão;
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Estruture encontros regulares (mensais ou trimestrais) para revisar os números e propor ajustes estratégicos;
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Incentive uma cultura de prestação de contas e diálogo, em que a governança seja vista como valor, não custo.
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Cultura de transparência e disciplina
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Promova a separação entre a pessoa física e a jurídica, especialmente em empresas familiares;
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Incentive a prestação de contas formal, com relatórios objetivos e metas claras;
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Use a controladoria para alimentar o planejamento financeiro anual, o orçamento e as decisões de investimento.
Benefícios concretos (e tangíveis)
Quando uma PME investe em controladoria e conselho consultivo:
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Reduz drasticamente o risco de crises de liquidez e insolvência;
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Ganha previsibilidade para planejar crescimento sustentável;
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Potencializa a alocação inteligente de recursos, evitando desperdícios;
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Eleva seu nível de governança, tornando-se mais atraente para investidores, parceiros ou financiadores;
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Constrói resiliência para enfrentar os ciclos econômicos, taxas de juros elevadas e choques externos.
O próximo passo para quem deseja crescer com segurança
Em momentos de crescimento, muitas PMEs enfrentam o dilema de avançar rápido demais sem estrutura. Eu insisto: avançar sem uma controladoria eficaz é navegar no escuro.
Para evitar cair nas estatísticas alarmantes de inadimplência ou recuperação judicial, que hoje atingem milhões de MPEs no Brasil, é preciso combinar visibilidade financeira, governança e um olhar estratégico externo, por meio de um conselho consultivo.
Essa combinação não é apenas “bom para ter”: é essencial para garantir sustentabilidade, longevidade e, de fato, crescimento de valor.
Se você lidera uma PME e ainda não investiu nisso, pergunte a si mesmo: estou crescendo com segurança, ou estou apenas romantizando o caos?
Carlos Moreira - Há mais de 37 anos atuando em diversas empresas nacionais e multinacionais como Manager, CEO (Diretor Presidente), CFO (Diretor Financeiro e Controladoria), CCO (Diretor Comercial e de Marketing). e Conselheiro Administrativo.