O futuro da educação é humano na finalidade e inteligente nos meios :: Por Jânyo Diniz
Jânyo Diniz*
Nos últimos dias recebemos com entusiasmo a notícia de que o Brasil ultrapassou a marca de 10 milhões de matrículas e, pela primeira vez, a educação a distância (EaD) superou o ensino presencial, representando 50,7% do total. É um fato a se comemorar, afinal, estamos ampliando o acesso a formação superior. Há, porém, um componente novo que redefine o que entendemos por qualidade e pertinência: a Inteligência Artificial (IA). Se o EaD deu escala, a IA pode dar profundidade, personalização e, principalmente, relevância econômica ao aprendizado.
Isso não significa substituir professores, nem transformar cursos em tutoria automática. Significa integrar sistemas de IA ao currículo para diagnosticar lacunas, ajustar o ritmo de estudo, criar trilhas personalizadas e oferecer prática orientada por dados em tempo real. Um curso que incorpora simuladores, laboratórios virtuais, avaliação baseada em projetos e feedback imediato da IA aproxima a formação das competências que o trabalho já exige— resolução de problemas com dados, pensamento computacional, comunicação, colaboração em ambientes digitais e, cada vez mais, capacidade de trabalhar com a IA, não contra ela.
A urgência é estratégica. A próxima década verá a automação invadir tarefas rotineiras e cognitivas de nível intermediário. Se a universidade não liderar a transição, o País corre o risco de viver perdas rápidas de emprego e renda, com impactos mais fortes nas faixas salariais mais baixas e nas regiões menos dinâmicas. A resposta não é frear a tecnologia; é orquestrá-la para proteger pessoas.
Isso se faz de três maneiras articuladas. Primeiro, alfabetização em IA para todos os cursos, do Direito à Enfermagem, com ênfase em uso responsável, privacidade, vieses algorítmicos e ética acadêmica. O objetivo é formar profissionais capazes de auditar ferramentas, interpretar saídas e decidir com discernimento. A segunda maneira é desenvolver a empregabilidade baseada em projetos: cada disciplina precisa se conectar a problemas reais, usando dados e ferramentas que o mercado utiliza, com participação ativa de empresas na proposição, mentoria e avaliação dos desafios.
O Terceiro e último ponto são credenciais empilháveis: além do diploma, microcertificações verificáveis em programação aplicada, análise de dados, automação de processos, marketing analítico, cibersegurança, saúde digital, etc., que possam ser obtidas ao longo do curso e valham imediatamente no mercado de trabalho.
Nenhum desses movimentos prospera sem governança. A IA na educação exige políticas claras de integridade acadêmica, registros transparentes do uso de modelos, auditorias periódicas de qualidade e resultados, e proteção de dados sensíveis. Exige, também, infraestrutura: conectividade, dispositivos, bibliotecas e laboratórios virtuais acessíveis, sobretudo nas regiões onde o EaD mais cresce. E demanda formação continuada dos docentes, com tempo institucional e incentivos para redesenhar aulas, rubricas e avaliações.
A universidade que apenas “adiciona IA” mantém o velho curso com uma ferramenta nova. Já aquela que reconfigura currículo, avaliação e vínculo com o mundo do trabalho constrói um sistema resiliente à automação.
O Brasil está diante de um ponto de inflexão. O EaD provou que conseguimos escalar o acesso. A rede privada demonstrou capacidade de investir e interiorizar a oferta. Falta transformar essa massa de matrículas em mobilidade social mensurável. A inteligência artificial é a chave para personalizar trilhas, acelerar o desenvolvimento de competências e encurtar a distância entre sala de aula e emprego. O futuro da educação, portanto, não é apenas digital. Ele é humano na finalidade, inteligente nos meios e transformador nos resultados.
*Jânyo Diniz, CEO do Grupo Ser Educacional e Presidente do Sindicato das Instituições de Ensino Superior de PE