Cinema universitário vira protagonista de um imaginário decolonial em Veneza
“Brasil: Entre cores, cantos e desencantos. A natureza de Rugendas e Villa-Lobos” leva crítica colonial e poesia visual ao coração da Europa, provando que o cinema universitário é, sim, protagonista de um novo imaginário global
Se você ainda não ouviu falar de “Brasil: Entre cores, cantos e desencantos. A natureza de Rugendas e Villa-Lobos”, prepare-se para atualizar seu radar cultural.
O curta-metragem da talentosa Shéron Morales, estudante do Departamento de Música da Universidade Federal de Sergipe, foi selecionado pelo La Sur Real Film Festival. A obra cruzou o Atlântico e pousou com elegância na charmosa cidade de Veneza, na Itália, onde foi exibida no dia 9 de novembro de 2025.
A exibição ocorreu no Laboratorio Occupato Morion, um espaço de pura efervescência política, artística e comunitária.
Festival com propósito
E não estamos falando de qualquer festival. O La Sur Real Film Festival é o tipo de evento que não se contenta com o óbvio. Ele busca obras do Sul Global que desafiem narrativas coloniais, provoquem o status quo e ofereçam novas lentes para enxergar o mundo. É cinema com propósito, com pulso, com poesia e protesto. E foi nesse cenário que a produção cinematográfica sergipana brilhou.
Enquanto muitos ainda subestimam o poder transformador da arte universitária, a estudante mostra que talento, crítica e sensibilidade podem atravessar oceanos e conquistar plateias exigentes.
A obra, que nasceu em um projeto de monitoria sob a batuta do professor João Liberato, é uma fusão poética e provocadora. Ela contrapõe as imagens do pintor alemão Johann Rugendas à música visceral de Villa-Lobos, cuja Floresta do Amazonas parece pulsar com o coração da terra. Mas não se engane: o curta não se limita à estética. Ele é uma reflexão contundente sobre a relação entre sociedade, natureza e colonialismo, uma espécie de espelho quebrado que nos obriga a encarar os fragmentos da nossa história com olhos mais atentos.
Vitrine Decolonial
Foi justamente essa ousadia que levou o filme a ser escolhido para a 4ª edição do La Sur Real Film Festival.
A mostra de cinema circula por cidades como Berlim, Leipzig, Frankfurt, Bogotá e Veneza, atuando como vitrine para obras do Sul Global que desafiam a supremacia branca patriarcal, questionam os paradigmas ocidentais e propõem uma leitura decolonial dos territórios. Em outras palavras, o festival não apenas exibe filmes, ele os transforma em ferramentas de ruptura e reconstrução.
Antes de Veneza, o curta já havia deixado suas marcas em solo brasileiro e europeu. Foi exibido na Mostra de Cinema Universitário Metrô (Curitiba), no Festival Oscarito (Rio de Janeiro), no CURTA 5 (Vitória da Conquista), no MCURO (Rio das Ostras) e também no Ardea Film Festival, em Roma. Uma trajetória que confirma: quando a arte nasce com propósito, ela não conhece fronteiras.
Shéron Morales não apenas criou um filme. Ela lançou uma reflexão ao mundo. Uma reflexão que ecoa entre cores, cantos e desencantos. E quem ousa escutá-la, talvez nunca mais veja o Brasil da mesma forma.
Parabéns à estudante. Que venham novas obras criativas para lançar o Brasil e o Nordeste cada vez mais longe.